domingo, 6 de julho de 2008

"Em 6 de julho de 1912, Augusto e o seu irmão Odilon custeiam a impressão de 1.000 exemplares do EU. O livro causa estranheza nos meios literários da então Capital Federal. Nada há, entretanto, que desperte a curiosidade da crítica para aquele livro que está fadado a ser único, não apenas no sentido de ser o único livro publicado pelo poeta, mas no sentido de sua excentricidade temática; do tratamento de linguagem, pleno de vocábulos e expressões científicas e filosóficas; das muitas rimas ricas que, por si, chamam a atenção para aquele poeta capaz de provocar surpresas a cada verso. Nada leva a acreditar que no exclusivismo daquelas formas, num movimento contrário ao elitíssimo tratamento poético construído por Augusto, esteja contido, para surpresa da crítica, um poeta e uma poesia extremamente populares, cujos versos, a partir da terceira edição, de 1928, não apenas passam a ser decorados, recitados e também cantados pela boca do povo. Augusto dos Anjos não viverá o suficiente para testemunhar a popularidade de sua lírica.

Em 22 de julho de 1914, muda-se pela última vez com a família. Em Leopoldina, aluga, finalmente, uma casa. A pequena cidade mineira é ainda mais provinciana do que a Paraíba que abandonara. Ali, ao menos, o poeta do antigo Pau d’Arco pode descansar da estafante lida. Ali, ao menos, pode cuidar da família no remanso da vida besta que passa lentamente na calçada. Ali morre Augusto dos Anjos antes mesmo de completar seis meses de aparente tranqüilidade.

A notícia do falecimento de Augusto dos Anjos logo corre porta a fora, levada não pela dor da mãe desconsolada, mas pela empregada da casa, Dona Ermíria que, ao perceber as lágrimas que longe estão de se conterem em sua fonte, pergunta à patroa enigmática o motivo de tanto desperdício de humor. Ao saber do acontecido, corre a mulher pela calçada a gritar aos que passam: morreu o magro, morreu Augusto, não sei se de tuberculose ou de susto.

Orris Soares acabava de se sentar, em companhia de amigos, no Pavilhão do Chá, onde funciona uma sorveteria e bar. Ao ouvir a má notícia recusa-se a acreditar; entretanto um ou outro amigo, passante ou cliente, confirma a verdade, havia ido em pessoa saber da veracidade e lá encontrara a mãe do poeta e a carta terrível. Orris pede uma cachaça, à memória de Augusto, brinda. Bebe. Bebe outra e outra, mais para afogar a lembrança do morto do que por vontade. Não há como afogar a reminiscência de quem morreu tão recentemente".

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